Porque em seis dias fez o SENHOR os céus e a terra, o mar e tudo que neles há, e ao sétimo dia descansou; portanto abençoou o SENHOR o dia do sábado, e o santificou.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Getsémani: oração e agonia de Jesus


 

Panorâmica da torrente do Cédron e o monte das Oliveiras vista de Jerusalém. Foto www.biblewalks.com
Panorâmica da torrente do Cédron e o monte das Oliveiras vista de Jerusalém. Foto www.biblewalks.com

Quando chega a hora marcada por Deus para salvar a humanidade da escravidão do pecado, contemplamos Jesus Cristo em Getsémani, sofrendo terrivelmente até derramar suor de sangue (cf. Lc 22, 44), e aceitando rendida e espontaneamente o sacrifício que o Pai lhe reclama (Amigos de Deus, 25).

Os relatos evangélicos transmitiram-nos a situação do local para onde Jesus se retirou uma vez terminada a Última Ceia: saindo então, foi, como de costume, para o monte das Oliveiras (Lc 22, 39), para o outro lado da torrente do Cédron (Jo 18, 1), e chegou com os Apóstolos a um lugar chamado Getsémani (Mt 26, 36; Mc 14, 32).
Segundo estas indicações, tratava-se de um horto onde havia uma prensa para extrair azeite – é esse o significado do nome -, e ficava fora das muralhas de Jerusalém, a este da cidade, no caminho para Betânia.

No horto das Oliveiras, perante a iminência da Paixão, que se desencadeará com a traição de Judas, o Senhor adverte a necessidade de rezar
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Como aquele lugar devia ser muito conhecido, pois Jesus reunia-se ali frequentemente com os discípulos (Jo 18, 2), não é de estranhar que os primeiros cristãos conservassem a memória de um local onde ocorreram factos transcendentais da história da salvação. No horto das Oliveiras, perante a proximidade da Paixão, que se desencadeará com a traição de Judas, o Senhor sente a necessidade de rezar: ficai aqui, enquanto Eu orar, disse aos Apóstolos. E tomou consigo Pedro, Tiago e João, e começou a aterrorizar-se e a angustiar-se. E disse-lhes:
- A minha alma sente uma tristeza de morte. Ficai aqui e vigiai.
E adiantando-se um pouco, prostrou-se por terra e orava para que, se fosse possível, passasse longe d’Ele aquela hora. E dizia:
- Abba, meu Pai! Tudo Te é possível! Afasta de mim este cálice; mas não se faça o que eu quero, senão o que Tu queres. (Mc 14, 32-36).

Na abside da esquerda figura a cena da traição de Judas. Foto: Leobard Hinfelaar.
Na abside da esquerda figura a cena da traição de Judas. Foto: Leobard Hinfelaar.
A dor era tal, que lhe apareceu então, do Céu, um Anjo para O confortar. Entrando numa luta angustiosa, pôs-se a orar mais instantemente e o suor tornou-se-lhe como grossas gotas de sangue, que caiam na terra (Lc 22, 43-44). A oração de Cristo contrasta com a atitude dos Apóstolos: quando se levantou da oração e foi ter com os discípulos, encontrou-os adormecidos devido à tristeza. E disse-lhes:

- Por que dormis? Levantai-vos e orai para não entrardes em tentação (Mc 14, 37-42).
Jesus voltou por três vezes para junto dos que o acompanhavam, e nas três vezes os encontrou carregados de sono, até que já era tarde demais: Ainda podeis dormir e descansar...? Basta; chegou a hora. Eis que o Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos pecadores. Levantai-vos, vamos; já aí está o que me vai entregar.

Estando ainda a falar, chega de repente Judas, um dos doze, e com ele um tropel de gente com espadas e varapaus (Mc 14, 41-43). Com um beijo traiu o Senhor, que foi preso enquanto os discípulos o abandonavam e fugiam.

Graças à peregrina Egéria, sabemos que na segunda metade do séc. IV se celebrava uma liturgia na Quinta-Feira Santa «no lugar onde o Senhor rezou», e que havia aí «uma igreja formosa» (Itinerarium Egeriae, XXXVI, 1 (CCL 175, 79). Os fiéis entravam no templo, oravam, cantavam hinos e escutavam os relatos evangélicos sobre a agonia de Jesus no horto. Depois, dirigiam-se em procissão para outro local de Getsémani onde se recordava a prisão (Cf. Ibid., 2-3 (CCL 175, 79-80).
A basílica da Agonia chama-se também de Todas as Nações porque foram dezasseis os países que contribuíram para a sua construção Foto: Israel Tourism (Flickr).
A basílica da Agonia chama-se também de Todas as Nações porque foram dezasseis os países que contribuíram para a sua construção Foto: Israel Tourism (Flickr).

Seguindo esta tradição e outras igualmente antigas, são venerados atualmente três lugares relacionados com os acontecimentos daquela noite: a rocha sobre a qual o Senhor rezou, um horto que conserva oito oliveiras milenárias com alguns dos seus rebentos, e a gruta onde se terá efectuado a prisão. Apenas umas dezenas de metros os separam, na zona mais baixa do monte das Oliveiras, quase no fundo do Cédron, no meio de uma paisagem muito sugestiva: esta torrente, tal como a maioria dos “wadis” palestinos, é um vale seco e só recebe água com as chuvas do inverno; a encosta do monte, ao contrário do cimo, está pouco habitada, porque grandes extensões do terreno foram destinadas a cemitério; abundam os olivais, dispostos em terraços, e também os ciprestes, nas bermas dos caminhos.

A basílica da Agonia
No centro da basílica da Agonia venera-se a rocha onde se teria prostrado o Senhor em oração. Foto: Marie-Armelle Beaulieu/CTS.
No centro da basílica da Agonia venera-se a rocha onde se teria prostrado o Senhor em oração. Foto: Marie-Armelle Beaulieu/CTS.
A rocha sobre a qual, segundo a tradição, o Senhor orou, encontra-se no interior da basílica da Agonia ou de Todas as Nações. Recebeu este nome porque dezasseis países colaboraram na sua construção, que foi levada a cabo entre 1922 e 1924. Segue a planta das igrejas bizantinas, tendo chegado até nós pouco mais do que os alicerces, pois foi destruída por um incêndio, possivelmente antes do séc. VII. Media 25 por 16 metros, tinha três naves e três absides, e pavimentos adornados com mosaicos; conservam-se destes alguns fragmentos, protegidos por vidros, junto dos actuais. Ao edificar o santuário moderno, também se encontraram vestígios de outro da época medieval. Foi erigido pelos cruzados no mesmo lugar da basílica primitiva, mas de tamanho maior e com uma orientação diferente, virado para sudeste, o que leva a pensar que não se aperceberam dos restos precedentes. Ficou abandonado após a conquista de Jerusalém por Saladino.

Desde o Cédron, destaca-se o amplo átrio da basílica, com três arcos sustentados
por pilastras e colunas unidas. A fachada está rematada por um frontão. No tímpano, decorado com mosaicos, está representado Cristo como Mediador entre Deus e a humanidade. Nos dias de sol, a luminosidade no exterior contrasta com a penumbra do interior: as janelas filtram a luz com tons azulados, lilás e violeta, que recordam as horas de agonia de Jesus e convidam o peregrino ao silêncio, ao recolhimento e à contemplação. As doze cúpulas, sustentadas no centro da igreja por seis esbeltas colunas, reforçam esta sensação através de um mosaico que sugere o céu estrelado.
No presbitério, diante do altar, sobressai do pavimento a rocha venerada. Está rodeada por uma artística vedação em forma de coroa de espinhos. Por trás, na abside central, está representada a agonia de Jesus no horto; nas absides laterais, também em mosaico, figuram a traição de Judas e a prisão de Jesus.

O horto das Oliveiras
As oito oliveiras mais antigas de Gatsemani poderão remontar ao primeiro milénio. Foto: Leobard Hinfelaar.
As oito oliveiras mais antigas de Gatsemani poderão remontar ao primeiro milénio. Foto: Leobard Hinfelaar.
O terreno onde se ergue a basílica é propriedade da Custódia da Terra Santa desde a segunda metade do séc. XVII. Quando foi adquirido, o mais notável que conservava, além das ruinas medievais e bizantinas, era o chamado jardim das flores: uma área não cultivada, cercada por um muro, onde cresciam oito oliveiras que a tradição local datava da época de Cristo.
Enquanto os franciscanos esperavam o momento oportuno para reconstruir a igreja, protegeram aquelas oliveiras milenárias, ligadas sem dúvida à tradição cristã do lugar, de modo que chegaram até nós com vida. Impressiona o seu aspeto velho. Os botânicos que as estudaram não chegaram a um consenso quanto à sua idade: alguns defendem que foram plantadas no séc. XI e que vêm do mesmo ramo, e outros que a sua enorme espessura permite sugerir que remontam ao primeiro milénio. Sejam mais ou menos antigas, isso não retira interesse à sua preservação como testemunhas silenciosas que perpetuam a recordação de Jesus e da última noite da sua passagem pela terra.

A gruta da Prisão
O recinto da basílica da Agonia e do horto de Getsémani inclui também um convento franciscano. Fora da propriedade, umas dezenas de metros para norte, está a gruta da Prisão, que também pertence à Custódia da Terra Santa. Acede-se a ela através de um corredor estreito, que parte do pátio de entrada para a Sepultura da Virgem. Este santuário mariano merecerá um artigo separado, em conjunto com a basílica da Dormição do monte Sião: por agora, basta dizer que, de acordo com algumas tradições, para ali teria sido trasladado o corpo de Nossa Senhora desde o bairro do Cenáculo, antes da Assunção; a igreja é partilhada pelas comunidades grega, arménia, síria e copta.

O corredor à direita da igreja da Assunção leva à gruta da Prisão. Foto: Leobard Hinfelaar.
O corredor à direita da igreja da Assunção leva à gruta da Prisão. Foto: Leobard Hinfelaar.
A gruta mede uns 19 metros de comprimento por uns 10 de largura. Alguns vestígios arqueológicos permitem pensar que era utilizada como residência temporária ou como armazém pelo dono do horto. Pensa-se que foi aqui que os oito Apóstolos descansaram na noite em que Jesus foi preso. Depois das horas em agonia e oração, quando o Senhor se apercebeu da chegada de Judas, teria ido aí com os outros três Apóstolos para os avisar do que ia suceder. Portanto, desse lado de Getsemani Jesus terá saído ao encontro do tropel de guardas.

Numerosos grafitos, gravados pelos peregrinos em diversas línguas e épocas, sobre o reboco das paredes e o teto, constituem testemunho de uma veneração quase ininterrupta: no séc. IV, a caverna já era utilizada como capela e o pavimento tinha sido adornado com mosaicos; do séc. V até ao VIII, acolheu sepulturas cristãs; na época dos cruzados, foi decorada com frescos; a partir do séc. XIV, os franciscanos obtiveram alguns direitos de culto sobre o lugar, até que finalmente conseguiram adquiri-lo. Um restauro realizado em 1956 revelou a estrutura primitiva, com um lagar e uma cisterna; acima da gruta, na mesma propriedade, descobriram-se os restos de uma antiga prensa de azeite.
A gruta dos Apóstolos, ou da Prisão, conserva vestígios de veneração continuada. Foto: Enrique Bermejo/CTS
A gruta dos Apóstolos, ou da Prisão, conserva vestígios de veneração continuada. Foto: Enrique Bermejo/CTS

Não se faça a minha vontade...
São tantas as cenas em que Jesus Cristo fala com o seu Pai, que se torna quase impossível determo-nos em todas. Mas penso que não podemos deixar de considerar as horas, tão intensas, que precederam a sua Paixão e Morte, quando se prepara para consumar o Sacrifício que nos reconduzirá ao Amor Divino. Na intimidade do Cenáculo o seu Coração transborda, dirige-se suplicante ao Pai, anuncia a vinda do Espírito Santo, anima os seus a um contínuo fervor de caridade e de fé.

Esse fervoroso recolhimento do Redentor continua em Getsémani, quando se apercebe de que já está iminente a Paixão, com as humilhações e as dores que se aproximam, essa Cruz dura, onde suspendem os malfeitores e que Ele desejou ardentemente. Pai, se é do teu agrado, afasta de mim este cálice (Lc 22, 42). E logo a seguir: não se faça, contudo, a minha vontade, mas a tua. (Ibid.) (Amigos de Deus, 240).

Se estamos conscientes de que somos filhos de Deus, de que a nossa vocação cristã exige seguir os passos do Mestre, a contemplação da sua oração e agonia no horto das Oliveiras há-de levar-nos ao diálogo com Deus Pai. «Quando ora, Jesus já nos ensina a orar» (Catecismo da Igreja Católica, 2607); e além de ser o nosso modelo, convoca-nos à oração, tal como a Pedro, Tiago e João, quando os levou consigo e lhes pediu que vigiassem com Ele: orai, para não entrardes em tentação. E Pedro adormeceu. - E os outros Apóstolos. - E adormeceste tu, menino amigo... e eu fui, também, outro Pedro dorminhoco. (Santo Rosário, I Mistério Doloroso).

Na abside central está representada a oração de Jesus. Foto: Leobard Hinfelaar.
Na abside central está representada a oração de Jesus. Foto: Leobard Hinfelaar.
Não há justificação para se abandonar ao sono: todos podemos rezar; com mais exactidão, todos devemos rezar, porque viemos ao mundo para amar Deus, louvá-lo, servi-lo e depois, na outra vida - aqui estamos de passagem -, gozar eternamente. E o que é rezar? Simplesmente, falar com Deus através de orações vocais ou na meditação. Não há desculpas de que não sabemos ou nos cansamos. Falar com Deus para aprender d’Ele, consiste em olhá-lo, em contar-lhe a nossa vida - trabalho, alegrias, penas, cansaços, reacções, tentações -; se O escutarmos, ouviremos o que nos sugere: deixa aquilo, sê mais amável, trabalha melhor, serve os outros, não penses mal de ninguém, fala com sinceridade e com educação.. (Javier Echevarría, Getsemani: em oração com Jesus Cristo, p. 12).

Bento XVI, numa audiência que dedicou à oração de Jesus em Getsemani, referia-se à capacidade que os cristãos têm, quando procuram uma intimidade cada vez maior com Deus, de trazer para esta terra uma antecipação do céu: «cada dia na oração do Pai-Nosso nós pedimos ao Senhor: «Seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu» (Mt 6, 10). Isto é, reconhecemos que há uma vontade de Deus connosco e para nós, uma vontade de Deus sobre a nossa vida, que deve tornar-se cada dia mais a referência da nossa vontade e do nosso ser; além disso, reconhecemos que é no «céu» que se cumpre a vontade de Deus, e que a «terra» só se torna «céu», lugar da presença do amor, da bondade, da verdade e da beleza divina, se nela se cumprir a vontade de Deus. Na prece de Jesus ao Pai, naquela noite terrível e admirável do Getsémani, a «terra» tornou-se «céu»; a «terra» da sua vontade humana, abalada pelo pavor e pela angústia, foi assumida pela sua vontade divina, de maneira que a vontade de Deus se cumpriu sobre a terra. E isto é importante inclusive na nossa oração: devemos aprender a confiar-nos mais à Providência divina, pedir a Deus a força para sairmos de nós mesmos e renovarmos o nosso «sim», para lhe repetirmos: «Seja feita a vossa vontade», para conformarmos a nossa vontade com a sua» (Bento XVI, Audiência, 1-II-2012).
Jesus, só e triste, sofria e empapava a terra com o Seu sangue. De joelhos, sobre a terra dura, persevera na oração... Chora por ti... e por mim: esmaga-O o peso dos pecados dos homens

Jesus, só e triste, sofria e empapava a terra com o Seu sangue. De joelhos, sobre a terra dura, persevera na oração... Chora por ti... e por mim: esmaga-O o peso dos pecados dos homens (Santo Rosário, I Mistério Doloroso).

Dirige-te a Nossa Senhora e pede-lhe que te faça a oferta - prova do seu carinho por ti - da contrição, da compunção pelos teus pecados e pelos pecados de todos os homens e mulheres de todos os tempos, com dor de Amor.
E com essa disposição, atreve-te a acrescentar: - Mãe, Vida, minha Esperança, conduz-me pela tua mão..., e se há alguma coisa agora em mim que desagrada ao meu Pai-Deus, concede-me que a veja e que, entre os dois a arranquemos.
Continua sem medo: - Ó clementíssima, ó piedosa, ó doce Virgem Santa Maria! roga por mim, para que, cumprindo a amabilíssima Vontade do teu Filho, seja digno de alcançar e gozar as promessas de Nosso Senhor Jesus

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